segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Revisitando Maiakovisk. Ou sobre o silêncio pode ser mortal

Por Luiz Mello

Quando adolescente, no final dos anos 70, uma das máximas da resistência ideológica de minha geração era um trecho de poema atribuído ao russo Maiakovski, mas que é de Eduardo Alves da Costa. Intitulado No caminho com Maiakoviski, em um trecho diz assim: “Na primeira noite eles se aproximam / e roubam uma flor / do nosso jardim. / E não dizemos nada. / Na segunda noite, já não se escondem; / pisam as flores, / matam nosso cão, / e não dizemos nada. / Até que um dia, / o mais frágil deles / entra sozinho em nossa casa, / rouba-nos a luz, e, / conhecendo nosso medo, / arranca-nos a voz da garganta. / E já não podemos dizer nada”. Creio que é hora de dizermos:

SOMOS LÉSBICAS, TRAVESTIS, GAYS E TRANSEXUAIS. SOMOS MULHERES E FAZEMOS ABORTOS. REIVINDICAMOS ACESSO IGUALITÁRIO AO CASAMENTO, À UNIÃO ESTÁVEL, AO DIVÓRCIO, À INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL, À BARRIGA DE ALUGUEL, À ADOÇÃO. QUEREMOS TER DOIS PAIS HOMENS OU DUAS MÃES MULHERES. SOMOS CATÓLICOS-AGNÓSTICOS-UMBANDISTAS-EVANGÉLICOS-ATEUS E ESTAMOS EM TODOS OS LUGARES.

Não há nenhuma necessidade real de pertencermos a qualquer desses grupos ou de desejarmos usufruir qualquer dos direitos que lhes são negados. O fundamental é ter a clareza de que não se trata apenas de uma ameaça à cidadania e mesmo à sobrevivência física de pessoas homossexuais, travestis, transexuais e de mulheres heterossexuais, embora a garantia de seus direitos humanos seja um imperativo absoluto. Num nível além das aparências mesquinhas, o que está em jogo é algo precioso para todas as pessoas, por serem princípios fundamentais da vida democrática: a laicidade do Estado, a liberdade e autonomia dos indivíduos, a garantia da igualdade na esfera pública.
Agora são as mulheres e os segmentos LGBT os alvos do desejo de morte física e simbólica dos que se auto-intitulam representantes da única concepção aceitável de vida e de humanidade. Amanhã continuarão a ser eles, concretamente expulsos de seus trabalhos e perseguidos rua afora, por termos feito abortos ou por amarmos um igual... Depois de amanhã, ... poderá ser qualquer um que se torne o o(a)bjeto da ira dos intolerantes seguidores de um deus inventado para justificar uma lógica perversa de manutenção de privilégios, para os de sempre: machos-dominantes-heterossexuais e os que com eles se macomunam. Basta olhar quem são os donos do poder e quem ocupa majoritariamente os espaços de decisão política de nossa sociedade – nos poderes legislativo, judiciário e executivo, nas igrejas, no tráfico de drogas, na estrutura policial, etc.
Não sei se é lenda, mas há alguns anos ouvi uma história incrível: quando os nazistas invadiram a Dinamarca, não conseguiram prender grande número de gays e lésbicas, diferentemente do que ocorreu em muitos outros países durante a segunda guerra mundial. Antes que as prisões se tornassem um fato irremediável, centenas de milhares de dinamarqueses começaram a usar voluntariamente em suas roupas o símbolo do triângulo rosa invertido, empregado por nazistas para identificar homossexuais nos campos de concentração. A solidariedade foi a fonte da resistência. Não é à toda que muitos anos depois a Dinamarca tornou-se o berço dos direitos conjugais de lésbicas e gays na contemporaneidade.
Apenas por muito pouco estamos hoje distantes das mãos dos que se sentem no direito de dizer quem deve e quem não deve viver – e como viver -, seja por razões de Estado, seja por razões religiosas. Isso é inaceitável. Quando um grupo de pessoas se vê na iminência de perder direitos de cidadania e humanos por terem se tornado o bode expiatório da vez, toda a estrutura democrática da convivência humana está ameaçada. Num momento em que o machismo homofóbico é nitroglicerina pura e o combustível ideológico das igrejas nas disputas de poder relacionadas a um projeto de sociedade que nega direitos sexuais e reprodutivos a grupos específicos, um caminho de resistência talvez seja dizermos que somos tod@s ess@ outr@ que querem calar, castrar, excluir e aniquilar. E é urgente fazermos isso agora, desobedientemente, sem medo de assumirmos politicamente a rebeldia do oprimido que se revolta e não aceita as bases da vida desumanizada que lhe está sendo imposta. Se nos calarmos neste momento, talvez amanhã não possamos dizer mais nada.

Prof. Luiz Mello é pesquisador do Ser-Tão e professor da Universidade Federal de Goiás no curso de Ciências Sociais

A movimentação dos bispos pró-Dilma

No segundo tempo a bola vai rolar elegantemente pelo gramado e balançar a rede, é goool do Brasil...

Por Dom Luiz C. Eccel*


Desde que fiquei sabendo das candidaturas à Presidência da República, tive uma só atitude: não quero subestimar nenhum dos(as) candidatos(as), pois não sou melhor do que ninguém, e muito menos dono da verdade.

Pensava: aquele(a) que ganhar fará o melhor pelo nosso Brasil, pois irá se assessorar de pessoas competentes e honestas, e basta.

Passados alguns dias, iniciaram as propagandas eleitorais. Subitamente, a minha caixa de correio foi tomada por uma "avalanche" de e-mails contra uma candidata apenas, a Dilma Rousseff. Preciso dizer com todas as palavras, que fiquei indignado.

É importante dizer que logo que saiu a lista dos candidatos eu fiz a minha escolha.
Mas, o fato de ver diariamente o "tsunami" de "denúncias" contra esta candidata, na minha caixa de correio, revelando total falta de respeito para comigo e também para com a candidata, levou-me a refletir e a pesquisar. Perguntava-me: por que somente contra ela? Devo ser honesto e afirmar que não recebi nenhuma "matéria" contra qualquer outro(a) candidato(a).

A reflexão levou-me até Jesus Cristo, que um dia disse: "Quem não tiver pecado, atire a primeira pedra" (Jo 8,7).

Por que estão jogando pedras só na Dilma? Em 1Jo 1,10 está escrito: "Quem diz não ter pecados, faz a Deus de mentiroso". Conclusão: Os que jogam pedras não têm pecados. Eis o grande problema. Estão tomando o lugar de Deus. Mas, Ele mesmo, não tendo pecado, não jogou pedras na pecadora. Isto é muito sério. Na verdade quem joga pedras está negando Deus. E o saudoso Beato, Papa João XXIII, que nos chamou a todos, através do Concílio Vaticano II, a sermos uma Igreja misericordiosa e aberta aos novos valores, deixando o ranço de lado, pelo sopro Vivificante do Espírito Santo, disse: "A pessoa que deixa Deus de lado, se torna perigosa para si e para as outras pessoas".

E agora? A conversão é graça de Deus para pessoas abertas a Sua Misericórdia. "Os misericordiosos, alcançarão misericórdia" (Mt 5, 7) Mas as pessoas auto-suficientes, donas da verdade, prepotentes, por isso sempre prontas a jogar pedras nos outros, estão muito longe de "Deus, que é Amor" (1Jo 4,8).

Assim, concluí: Todos somos pecadores, mas uma só pessoa está levando pedradas nesta campanha eleitoral à presidência do Brasil. Aí, eu que já havia escolhido o meu candidato, fiz uma nova escolha. Decidi, diante de Deus, que esta mulher apedrejada é a minha candidata para presidir o Brasil. Tem também um velho ditado popular que diz: "Só se atira pedras em árvores que dão frutos bons". E pesquisando descobri que esta candidata, enquanto ministra, produziu muito e bons frutos.

Procurei me aprofundar mais no conhecimento da minha candidata. Descobri que é uma mulher honrada e séria. Arriscou sua vida, durante a ditadura militar, da tirania do poder que oprime, tortura e mata. Sim, a Dilma foi presa e torturada por querer um Brasil democrático, fraterno, solidário, com vida e dignidade para todas as pessoas e não somente para algumas.

Então pensei: é exatamente isto que o Pai do Céu quis e continua querendo para todas as pessoas. Esta questão somou vários pontos para a candidata.

Nosso saudoso e amado Dom Helder Câmara dizia: "Quando reparto o meu pão com os pobres, me chamam de santo, mas quando pergunto pelas causas da pobreza, me chamam de comunista".

Até hoje, as pessoas verdadeiramente comprometidas com um país mais justo e igualitário, e para isso precisa de projetos sérios de transformação, continuam sendo taxadas assim. Algumas pessoas, por incrível que pareça, em pleno século XXI, ainda conseguem meter medo numa certa camada da população com este jargão.

Analisei também o desempenho da candidata quando era funcionária no governo estadual e federal. Os frutos bons são abundantes, especialmente para os menos favorecidos. Sim, saiu-se muito bem. Mais um ponto para ela.

Percebi também que, levando pedradas, não retribuía, e isto está de acordo com o Evangelho. Mais um ponto para a Dilma.

Comecei a analisar as suas palavras, idéias e projetos. Uma mulher inteligente, sábia, abnegada, perspicaz e atualizada. Outro ponto para esta mulher.

Também fui apurar as "denúncias" que enchiam a minha caixa de correio. Descobri montagens falsas, mentiras e calúnias. Aí novamente lembrei-me de Jesus que disse: "O diabo é mentiroso e pai da mentira" (Jo 8,44).

Não tive mais dúvidas, é na Dilma que irei votar, independentemente de partido político.

Ninguém pode galgar degraus pisando nos outros. Isto não é nem humano, muito menos cristão.

Quem deseja servir o povo, precisa jogar limpo. Pessoa religiosa não é a que fica dizendo Senhor, Senhor..., mas aquela que faz a vontade de Deus. E a vontade de Deus é "que todos tenham vida e a tenham plenamente" (Jo 10,10).

A vontade de Deus é que todas as pessoas vivam como irmãos e irmãs, no respeito à vida de todos os seres. Descobri que a candidata Dilma tem este desejo profundo. Aliás, é o seu grande sonho que, juntamente com todo o povo, quer tornar realidade.

No domingo à noite, dia 10 de outubro, assisti ao debate promovido pela BAND. Um dos dons que Deus me concedeu foi o de conhecer as pessoas pelos seus olhos. Não costumo revelar o que vejo e sinto para todas as pessoas.

Durante o debate meus ouvidos estavam atentos às palavras dos candidatos, mas meus olhos foram atraídos para a expressão da sua face e a delicadeza do seu olhar.

Percebi duas atitudes muito interessantes: 1)Sua face estava sempre serena e seu leve sorriso não era forçado e nem transmitia falsidade. 2)Seus olhos, que são espelhos de sua alma, transmitiam segurança, confiança, ternura e sinceridade. Estas qualidades agregaram mais alguns pontos a Dilma.

Como nós precisamos destas atitudes que na verdade são qualidades e dons de Deus! Dilma você passou pelo gelo da dor, tantas vezes, e por isso chegou ao incêndio do verdadeiro amor que vem do alto.

Nosso saudoso e amado Dom Luciano Mendes de Almeida dizia: "a bondade rompe todas as barreiras". Avante minha irmã! Deus está com você. Cuide-se! Continue sendo bondosa e a confiar nas suas assessorias. Mas mantenha, discretamente, o controle de tudo para evitar desgostos e desgastes maiores e desnecessários, pois somos todos passíveis de erros. Mantenha-se sempre alerta e busque momentos de descanso na oração silenciosa para que Deus, que é Pai e tem a ternura da Mãe, lhe fale ao coração, plenificando-o de alegria e coragem. Dom Angélico, meu grande amigo e irmão, sempre diz: "Quem não reza vira monstro".

Dilma, desculpe eu falar abertamente que não iria votar em você. Busco ser sincero como você. Mas tenha certeza de que continuarei a pedir a Deus que a ilumine e abençoe, chegando ou não à Presidência. Não estou falando em nome da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), mas como cidadão e como Bispo da Igreja Católica, santa e pecadora, que deseja o melhor para o Povo de Deus.

Pessoalmente creio que é esta a hora de uma mulher experiente, honesta e competente, como você, chegar lá e continuar a fazer deste país, uma nação que defenda e proteja a vida de todos(as), desde a concepção até a morte natural.

Sim, neste segundo tempo a bola vai rolar elegantemente pelo gramado e balançar a rede!

Caçador, 12 de outubro de 2010 (solenidade de N. Sra. Aparecida. Padroeira do Brasil).

*Bispo Diocesano de Caçador-SC

http://www.adital.org.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=51642

Marx e religião no mundo presente

Marx, quando escreveu sua obra, tinha razões de sobra para criticar duramente as religiões. A situação atual o assombraria, vendo que o problema não seria mais o do velho idealismo metafísico. Ficaria surpreso com o materialismo pragmático do tempo presente.

Por Luís Carlos Lopes


Se Marx estivesse hoje vivo em carne e osso e tivesse vivido a experiência do século XX, talvez reformulasse uma de suas velhas máximas: “A religião é o ópio do povo”. Ficaria, possivelmente, estupefato com as novas perspectivas que alcançam a todos. Diria, hipoteticamente, que o consumo e a ilusão de classe são as novas drogas que alienam e que impedem que as maiorias compreendam o real. Veria que a luta continua, porém suas bases não seriam exatamente as mesmas. Os inimigos continuariam sendo os de sempre, mas as formas que eles se consubstanciam e parecem ser mudaram bastante.

Certamente, o velho barbudo e calejado pelo tempo teria uma sensação estranha em perceber que a comunicação humana havia se tornado muito mais complexa e incrivelmente maquínica. Ficaria extasiado com o mundo atual. Perceberia que nele existem mil e uma formas de se acessar ao conhecimento. Possivelmente, acharia paradoxal que, mesmo assim, o obscurantismo que conheceu em sua época permanece muito forte, quase inalterado. Entenderia, com alguma ajuda, que as velhas religiões foram modificadas e adequadas aos novos tempos dos sucessos do Capital. Veria que as novas igrejas são ainda mais integradas ao mundo dos negócios, à lógica do consumo e às ilusões de ascensão social.

Não seria difícil que mudasse os seus bordões, reclamando, por exemplo, do ‘culto às mídias’, da ‘teologia da prosperidade’ e da tentativa de se impedir que o ‘espírito laico’, isto é, a separação entre Estado e igrejas vencesse por toda parte. Veria que sua busca profunda por liberdade política e filosófica continua válida e atual, mesmo tendo-se passado quase dois séculos. Não obstante, teria uma surpresa em ver que alguns praticariam suas religiões de modo aceitável, tratando-as como problemas de foro íntimo, isto é, como algo individual, sem invadir outros espaços da vida.

Veria que entre muitos crentes nas religiões de hoje, existem os que aceitam as conquistas das ciências, que tanto melhoraram a vida humana. Notaria que muitos adeptos de várias igrejas não seguem integralmente os intermediários de suas crenças, quando o assunto é de interesse não-religioso. Quase ninguém dá a menor importância concreta às interdições sexuais propostas por várias igrejas. A contracepção é demonizada por elas, todavia, as grandes maiorias a praticam regularmente, por isso os índices de natalidade baixaram e continuam baixando. Quase ninguém é louco de não praticar sexo seguro porque o Papa disse que é pecado. Muitos exemplos podem ser dados, demonstrando que na vida prática os tabus foram quebrados, faltando um ajuste ideológico.

Na época do sábio alemão, isto não era possível. Ser religioso significava ser escravo dos padres e dos pastores que ditavam o que era certo ou errado, que controlavam as opiniões dos fiéis sobre qualquer assunto. Na maioria esmagadora das vezes, estes intermediários da fé também mediavam o poder das classes dominantes. Trabalhavam para que a ordem fosse mantida intocada. A escravidão espiritual era também sinônima das escravidões sociais e políticas. Por isto, ele comparou a religião a um narcótico, capaz de inebriar e dominar consciências.

No mundo atual, existem igualmente narcóticos poderosos para controlar e impedir qualquer mudança, mesmo que seja uma simples eleição. O problema é que eles não são mais necessariamente administrados de modo direto. Os espíritos estão pré-preparados pelos meios de comunicação e pelos sistemas de poder que os organizam e os direcionam. Quando um padre ou um pastor faz sua propaganda política está pisando em um terreno pronto para que a intriga, a mentira e a cizânia sejam disseminadas. Mídias de péssima qualidade, escolas que pouco ensinam e professores mal-pagos compõem o quadro. A publicidade dissemina as ilusões de classe, fazendo com que pobres se imaginem membros das classes mais ricas, porque melhoraram um pouco de vida. A ignorância é semeada como o trigo de cada dia e há pouco espaço para combatê-la.

Marx, quando escreveu sua obra, tinha razões de sobra para criticar duramente as religiões. A situação atual o assombraria, vendo que o problema não seria mais o do velho idealismo metafísico. Ficaria surpreso com o materialismo pragmático do tempo presente. Neste, se é materialista no que se refere ao consumo e à ascensão social. No resto, é possível acreditar em alguma religião sem que isto exija qualquer transcendência. A busca não é mais por deuses ou santos. O sucesso tomou o lugar dos mesmos e seus representantes são úteis se servem ao processo de se tentar ocupar uma vaga no sol monetário do capitalismo.

O velho autor em tela escreveu, quando vivo, para pouca gente que podia compreendê-lo. De seu tempo para hoje, milhões o leram e muitos ainda o deverão ler. Ele não perde a atualidade. O problema está em leituras religiosas que não o vêem em sua época e não procuram compreender o seu método. Estas leituras e razões de Estado proporcionaram o drama espetacular do socialismo real. Este se afastou em demasia do espírito do imenso trabalho intelectual do mesmo autor. Esse modo de divulgar Marx provoca, ainda hoje, imensos equívocos, que ao invés de aproximar as pessoas comuns, as afastam. Ele não era um deus ou um santo. Era um homem, com qualidades e defeitos como qualquer outro. O que se deve aproveitar é o seu imenso talento para propor um método de compreensão do mundo. Nisto, sua obra permanece viva e recomendável a quem quiser saber mais.

É possível ser religioso e se admirar Marx? A teologia da libertação efervescente em passado próximo descobriu que sim. Vários cristãos morreram, foram presos e torturados na América Latina, sendo adeptos de Cristo e do velho filósofo alemão. Ainda hoje, há quem siga a mesma cartilha, apesar da guerra travada contra eles em vários fronts: o já superado dos recentes Estados ditatoriais, o contínuo dos interesses dos poderosos e o do papado romano, a última monarquia absoluta da face da Terra.

Há quem não precise de religião alguma para pensar, mesmo assim, qualquer homem ou mulher possui crenças, isto é, acredita em algo que o impulsiona na direção do saber, da liberdade e da justiça social. De algum modo, todos crêem, ou melhor, as pessoas com qualidades especiais são as que mais acreditam que é possível viver em um mundo melhor. É preciso reconciliar a todos, respeitar diferentes modos de ver o mundo, com exceção daqueles que são anti-humanos, isto é, os que são construídos contra todos os seres de boa-vontade.

Luís Carlos Lopes é professor e escritor.

Desculpe, Marina, mas eu estou de mal

Por Maurício Abdalla.

Marina, há os que a conhecem de agora, como candidata aplaudida pelos mass media. Esses podem estar de bem com você. Mas há os que a conhecem como a militante cristã, engajada nas causas sociais que os que hoje a paparicam jamais tiveram sequer conhecimento – ou, de qualquer forma, com elas nunca se importaram. Há os que também a conhecem como a doce e ferina oposição ao Governo do PSDB em seu mandato como senadora. Esses, Marina, como eu, estão de mal.
Neutra, Marina? Neutros ficamos diante de questões que nos são indiferentes. É-lhe indiferente o futuro do nosso país? Custa-me crer, pois sua história um dia a posicionou. Posicionou-a, inclusive, ao lado de Lula. Não acredito que para você tanto faça a continuidade do atual Governo ou o retorno dos tucanos. Sabe por que, Marina? Porque não “tanto fez” para você durante os 5 anos e meio em que esteve no Governo. Ou você também ficaria tanto tempo como ministra de um Governo do PSDB/DEM? Ou se o governo Lula fosse igual ao do FHC? Alguma diferença havia de ter, não é verdade? Caso contrário, suas motivações passariam a ser um tanto quanto paradoxais.
Em que pese às decepções que tivemos, Marina, não nos é indiferente – a nós que pensamos nos pobres e na justiça social – o fato de 30 milhões de pessoas terem, hoje, o que comer. Não podemos dizer que tanto faz um salário mínimo de R$ 300,00 ou de R$ 510,00. Que mais 15 milhões de pessoas tenham emprego, em contraste com o presidente anterior que cunhou o termo “inempregáveis” como resposta ao desemprego, é fato que não pode deixar de tocar-nos o coração.
É diferente, Marina, tratar os presidentes de outros países, quando são índios, mestiços e ligados aos movimentos sociais, como legítimos mandatários ou tratá-los como ralé que deveria submeter-se aos EUA e ao sub-imperialismo de nosso país gigante.
Temos severas críticas ao Governo Lula, mas nenhuma delas se assemelha às críticas das elites e de seus meios de comunicação. Nenhuma delas pode ser superada por alguma proposta do Serra. Ao contrário, o retorno do PSDB/DEM apenas aumentará as nossas bandeiras de oposição.
Em situações como esta, a neutralidade é um péssimo exemplo para os jovens. Ainda espero que você se posicione. Ainda aguardo que você volte a ser a Marina, de família de seringueiros, cristã, militante, sindicalista e Silva. E que repita para essa juventude que não conheceu o governo do PSDB/DEM tudo aquilo que você já disse sobre ele no senado.
Ainda espero. Pois eu, ao contrário de Caymmi – e, em certo sentido, ao contrário também de você que ainda rumina uma mágoa mal digerida do Governo – “quando me zango, Marina, eu sei perdoar”.